Quem decide fazer uma cirurgia bariátrica, certamente ouve alguém falar: “você está optando pelo caminho mais fácil”; ou “você vai morrer”; ou “você vai ficar careca e sem dentes”; ou “se tiver um pouco de força de vontade, não precisa operar”; ou “vai precisar tomar vitamina a vida toda”; ou, ainda, “nunca mais você vai conseguir comer”. O fato é que este é um procedimento em que a falta de informação predomina.
O primeiro ponto a ser abordado é que a obesidade é uma doença, que causa muitas outras doenças, que podem matar. E, como se não bastasse, afeta de todas as formas a vida do indivíduo, que perde a vontade de sair de casa, sente vergonha da sua aparência, tem dificuldade, em alguns casos, até para amarrar um sapato ou fazer a própria higiene. Ele está assim por que quer? Não! Ele está assim porque está doente, e não porque é desleixado, como muita gente julga.
Vale lembrar que ninguém se torna obeso do dia para a noite e decide procurar um cirurgião para reduzir o seu estômago. A cirurgia costuma a ser cogitada quando o paciente já tentou de tudo para emagrecer ou quando a obesidade começa a se tornar um problema sério de saúde. Sim, porque ela é um dos maiores problemas de saúde pública que temos. E não adianta dizer “sou um gordinho saudável”. Não há gordinho saudável porque a obesidade, por si só, já é uma doença. E, mais cedo ou mais tarde, vai desencadear outras.
Então, quando alguém chega ao meu consultório e se enquadra nos critérios internacionais exigidos para que a cirurgia bariátrica seja realizada com segurança, eu sei que ele está no seu limite. E que fazer a cirurgia bariátrica é sua chance de mudar a atual situação porque ela é um tratamento eficaz, que, de fato, traz resultados. Importante destacar que ela não é a cura da obesidade; ela é um tratamento e vai precisar muito que o paciente adote novos hábitos de vida para manter os resultados a longo prazo.
Atualmente, nós temos no Brasil 13,6 milhões de pessoas com indicação para a cirurgia bariátrica. Assustador, não? E conseguimos operar apenas 2%. Como a obesidade cresce a cada ano, essa proporção só tende a piorar. O último balanço divulgado pela SBCBM (Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica) mostrou que, em 2018, o Brasil realizou 63.969 cirurgias bariátricas.
Então vamos lá:
– Você vai fazer a cirurgia e morrer – a cirurgia bariátrica é muito segura. As técnicas evoluíram consideravelmente ao longo dos anos e seus riscos são semelhantes ao de uma cesárea ou de uma retirada de vesícula. Apenas 2 de cada 1000 pacientes morrem em decorrência da bariátrica. Por outro lado, a obesidade faz cada vez mais vítimas. Um estudo sobre as causas de mortalidade de mais de 3,6 milhões de pessoas e sua associação com a obesidade, publicado na revista Lancet Endrocrinology em 2018, revelou que a cada 5 pontos a mais no IMC (Índice de Massa Corpórea) acima do ideal, há 20% mais chances de a pessoa morrer. Homens com IMC acima de 40 têm uma expectativa de vida nove anos menor que os que estão em seu peso ideal. Portanto, os riscos da obesidade são muito maiores que os da cirurgia.
– Você vai ficar careca e sem dentes – a maioria dos pacientes tem queda de cabelo nos primeiros meses após a cirurgia, mas, por volta de um ano de pós-operatório, a situação tende a se normalizar. A perda de dente é muito rara e só acontece se o paciente não repõe vitaminas por um longo período.
– Se tiver um pouco de vontade, emagrece – não é bem assim. A obesidade é uma doença multifatorial. E, apesar de algumas pessoas conseguirem emagrecer com tratamentos convencionais, para a maioria, isso é difícil.
– Você vai precisar tomar vitamina a vida toda – isso é verdade. Como o organismo deixa de absorver alguns nutrientes, é necessário fazer reposição, conforme orientação do cirurgião, endocrinologista e nutricionista.
– Nunca mais vai conseguir comer – esse é um dos maiores mitos da cirurgia. Logo após a cirurgia, há um período de restrição alimentar, que passa por dieta líquida, dieta pastosa e dieta branda. Depois disso, o paciente é liberado para comer de tudo, mas, com a cirurgia, vai se sentir saciado com uma quantidade muito menor. Com o passar do tempo, há uma tendência de que ele volte a comer, inclusive, porções maiores. Por isso, é muito importante o acompanhamento nutricional.
Citei apenas alguns dos casos aqui para esclarecer que o paciente obeso que opta pela cirurgia bariátrica precisa ser respeitado, afinal, este é o tratamento de uma doença. Precisamos nos informar melhor antes de fazer comentários e observações errôneas, que possam prejudicar o processo e causar desmotivação.
Se você souber de alguém que esteja pensando em fazer a cirurgia bariátrica, apenas o aconselhe a procurar um bom cirurgião, credenciado pela SBCBM. Lá, ele será encaminhado a uma equipe multidisciplinar. Juntos, vão avaliar os prós, os contras e dar todo o suporte. E, claro, baseados em evidências científicas.
Dr. Admar Concon Filho é cirurgião bariátrico, cirurgião do aparelho digestivo e médico endoscopista.
Palestrante internacional, presidente do Hospital e Maternidade Galileo e fundador e coordenador do Grupo de Cirurgia Bariátrica de Valinhos.
Também é membro titular e especialista pelo Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva, Colégio Brasileiro de Cirurgiões e
Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva,
além de membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica e
membro da International Federation for the Surgery of Obesity and Metabolic Disorders. CRM – 53.577
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